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Câncer: o que sabemos sobre a doença hoje?

Avanço em exames, prevenção e tratamentos aumenta chances para quem é diagnosticado

Por Danielle SanchesPublicado em 25/11/2022, às 10:49 - Atualizado em 07/06/2023, às 16:41
Imagem: Shutterstock

Talvez você não saiba, mas a origem da palavra “câncer” remonta ao período histórico da Antiguidade, quando o então grego Hipócrates (considerado o pai da medicina), por volta de 400 a.C., viu semelhanças entre um tumor cercado de vasos sanguíneos e um caranguejo com as patas na areia. 

Daí veio a palavra “karkinos” que, em grego, é a origem do termo “câncer” – uma doença considerada hoje a segunda maior causa de mortes no mundo (perdendo apenas para as doenças cardiovasculares). No entanto, em um passado não muito distante, o estigma da condição era tamanho que muitas pessoas se recusavam a dizer seu nome. 

Felizmente, esse cenário está ficando para trás graças aos avanços da ciência, que cada vez mais descobre novas formas de diagnóstico e tratamento – oferecendo não só mais chances de cura como qualidade de vida para os que vão conviver com a doença. 

“O câncer é uma doença muito impactante e muitas pessoas morriam disso, daí o estigma em torno dela”, afirma Luiz Henrique Araújo, coordenador de oncologia do Hospital São Lucas Copacabana, no Rio de Janeiro, e head de oncologia da Dasa Genômica. “Mas, hoje, já vemos mais gente que se trata e se recupera ou que convive com o problema, o que tende a diminuir esse medo”, acredita o médico. 

Arte: Andrea Petkevicius

Câncer e estilo de vida: qual a relação?

Em um artigo publicado em agosto de 2022 na revista científica The Lancet, os pesquisadores neozelandeses Diana Sarfati e Jason Gurney apontaram que “o crescimento global de casos de câncer está rapidamente excedendo a capacidade atual de controle” da doença. 

De fato, a estimativa do Global Cancer Observatory é de que, até 2040, sejam diagnosticados 30 milhões de novos casos anualmente, com 16 mil mortes todos os anos. A pergunta que todos se fazem, claro, é como podemos parar a disparada desses números – se é que isso é possível. 

“Não existe risco zero quando falamos de câncer, já que o fator de risco principal é o envelhecimento”, afirma Thereza Loureiro Cavalcanti, médica geneticista especialista em oncogenética da Dasa Genômica.

“O câncer é heterogêneo, ele depende de uma predisposição genética, de fatores ambientais e também do acaso”, explica. “Nem todo mundo com uma mutação genética vai ter a doença, enquanto pessoas saudáveis podem ter. Não sabemos tudo”, afirma. 

Ela lembra, no entanto, que os “fatores modificáveis”, como mudanças no estilo de vida e realização de exames preventivos, podem, sim, reduzir o risco da doença e também aumentar a chance de recuperação em caso de diagnóstico positivo. 

Hoje, sabe-se que pelo menos 50% dos casos de câncer podem ser evitados ao evitar fatores de risco ligados aos hábitos de vida. Parar de fumar, consumir mais alimentos naturais, evitar ultraprocessados e excesso de álcool, praticar atividade física, gerenciar estresse e ter um bom convívio social são mudanças que têm resultados cientificamente comprovados para evitar o surgimento de tumores.

Curiosamente, são medidas que também têm impacto na prevenção de outras doenças, como as cardiovasculares e as neurodegenerativas, como as demências – indicando que o corpo tem um equilíbrio próprio que precisa ser respeitado. 

E engana-se quem acha que tudo isso precisa ser feito na juventude. “Nunca é tarde para começar. Mesmo quem já recebeu o diagnóstico se beneficia dessas mudanças com mais chances de recuperação”, afirma Araújo. 

Se, por um lado, não é possível (ainda) afirmar que alguém terá ou não câncer, por outro, a rotina de exames preventivos é uma poderosa aliada para garantir que, se a doença vier, ela será detectada rapidamente – aumentando e muito as chances de recuperação do paciente. 

Isso porque grande parte dos tumores, quando encontrados precocemente, podem ser eliminados com o tratamento adequado. “A maioria das recomendações é feita por associações médicas com base na frequência com que a doença surge na população”, explica Cavalcanti. “Já outros exames vão variar de acordo com o histórico familiar de cada paciente.”

Arte: Andrea Petkevicius

O papel da genética

Todo câncer começa porque algum gene foi alterado e as células passaram a se multiplicar de forma descontrolada. Mas alguns tipos de câncer podem ser chamados de hereditários, quando uma mutação específica ocorre em um gene que é herdado pelos pais do indivíduo. 

Atualmente, a ciência já conseguiu mapear mais de 200 tipos de mutações. É o caso, por exemplo, das alterações nos genes BRCA1 e BRCA2, conhecidos por aumentar o risco para o desenvolvimento de câncer de mama e de ovário. 

Outras também conhecidas são alterações que predispõem ao câncer de útero, pulmão, cólon, estômago, pâncreas e próstata.

E, embora esse avanço da medicina genética não permita impedir que a doença apareça, ela tem uma grande importância no trabalho de prevenção e detecção precoce. “Saber que existe uma hereditariedade no câncer permite que o indivíduo faça um programa de rastreamento mais assertivo para seu contexto de vida”, afirma Carlos Dzik, diretor da regional São Paulo da Dasa Oncologia. 

Além de ajudar a descobrir genes que aumentam o risco para neoplasias, o mapeamento genético também é importante para auxiliar na escolha do tratamento uma vez que a doença tenha sido diagnosticada. 

“Sabemos que tratar determinados tumores com medicamentos específicos traz mais chances de sucesso no tratamento”, afirma Dzik. “É a chamada medicina de alta precisão, que também evoluiu graças ao avanço do mapeamento genético”,explica. 

Após ler tudo isso, é normal sentir um frio na espinha e se perguntar: será que eu sou portador de alguma mutação? Mas, no universo dos cânceres, esses tumores representam cerca de 5% dos diagnósticos. 

Por isso, os exames de mapeamento genético são recomendados apenas para quem de fato possui tumores que surgem com grande frequência na família – como é o caso do câncer de mama e ovário, por exemplo. 

E mesmo quem descobre ser portador de uma mutação deve ter clareza de que isso não é uma sentença. “Ter o gene alterado aumenta a predisposição à doença, mas isso não é certeza”, afirma Cavalcanti. “Mesmo quem tem hereditariedade na doença deve saber que os hábitos de vida e o meio ambiente também têm uma influência importante nessa equação”, alerta. 

Tratamentos: como combater o câncer?

Uma vez que o diagnóstico exista, o próximo passo é pensar nas opções de tratamento. Isso vai depender do tipo e estágio do tumor, bem como de onde ele está localizado e ainda do estado geral de saúde do paciente. 

Os tipos de tratamento disponíveis hoje são: 

  • Cirurgia: remove o tumor e pode ser curativa se feita em estágios bem iniciais da doença em alguns casos. Também pode ser feita para a realização de biópsia e avaliação mais detalhada do tumor.
  • Quimioterapia: composta por  medicamentos que combatem as células cancerosas no organismo. Podem ser aplicadas de forma intravenosa ou via oral, a depender do tipo de câncer. 
  • Radioterapia: utiliza radiações ionizantes (como raio-x e raio gama, entre outras) para inibir o crescimento das células tumorais. 
  • Hormonioterapia: reduz a circulação de hormônios que podem estimular o crescimento anormal de células sensíveis a eles.
  • Imunoterapia: utiliza o próprio sistema imunológico do paciente ou anticorpos produzidos em laboratório para combater o tumor. 
  • Terapia alvo: utiliza medicamentos desenvolvidos para atacar especificamente elementos (como proteínas) presentes na superfície ou no interior das células tumorais. 
  • Transplante de medula óssea: utiliza células-tronco que estão dentro da medula para tratar leucemias e mielomas – cânceres que costumam modificar células importantes do sangue. 

De acordo com Dzik, o maior avanço ocorreu nos últimos anos no campo da imunoterapia, que desenvolveu novas opções bastante promissoras para tratar cânceres bastante agressivos. 

“As terapias alvo e medicina de precisão, que usam medicamentos específicos a partir do conhecimento de partes do tumor, só foram possíveis graças ao avanço da genética”, afirma o especialista. 

Recentemente, por exemplo, foi apresentado um tratamento que utiliza um vírus geneticamente modificado para atacar as células tumorais – um medicamento chamado Vaxinia. 

O tratamento consiste em utilizar o vírus para infectar e matar a célula cancerosa. Ao morrer, as células cancerígenas liberam mais cópias do vírus, o que gera uma resposta imunológica do organismo, que passa a combater o câncer também. 

De acordo com a médica Carolina Chaul, coordenadora da área de Neuro Oncologia da Dasa, os poxvírus – causadores de doenças como a varíola e a varíola dos macacos – têm uma afinidade maior com o nosso organismo e, por isso, estão sendo usados nos testes para esse tipo de tratamento. 

Na linha da imunoterapia, as CAR-T Cells são hoje consideradas um dos maiores avanços no tratamento de mielomas e leucemias. O tratamento consiste em reprogramar geneticamente os linfócitos T – células de defesa do nosso corpo – do paciente para que eles ataquem o tumor. 

“É como ensinar o organismo a combater o câncer sozinho”, afirma Dzik. Mas é um tratamento que pode ser, nas palavras do médico, “brutal”. “O paciente precisa ter condições para receber as células, pois há uma grande inflamação no corpo após a infusão e, dependendo da situação, pode levar o indivíduo à morte”, alerta. 

Outro avanço científico que precisa ser mencionado é no campo dos diagnósticos oncológicos. Aparelhos de imagem, por exemplo, evoluíram substancialmente nos últimos 20 anos. 

“Aparelhos de imagem são muito mais sensíveis e conseguem captar mais detalhes, aumentando a chance de diagnóstico de tumores ainda em fase inicial”, afirma Araújo. 

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