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Lactose, glúten e farinha: vilões?

Nos últimos tempos, eles foram parar no banco dos réus. Mas não há justificativas para isso

Por Sophie DeramPublicado em 10/10/2022, às 10:16 - Atualizado em 25/05/2023, às 16:06
Foto: Shutterstock

Você com certeza já ouviu falar por aí que, para ter uma alimentação saudável ou perder peso, é importante cortar a lactose, o glúten e a farinha. 

Mas será que é isso mesmo? Lactose, glúten e farinha são vilões? Entenda melhor a seguir.

Vamos começar pela lactose

Entre as diversas justificativas infundadas para retirar os lácteos da alimentação, temos a lactose, o açúcar do leite. 

Há algum tempo esse nutriente tem sido demonizado e os alimentos sem lactose passaram a ser vendidos como mais saudáveis e importantes para a perda de peso.

No entanto, se você não tem intolerância à lactose, não faz nenhum sentido consumir alimentos sem lactose, que geralmente são até mais caros. 

Vamos entender melhor. A lactase é uma enzima que digere a lactose. Quando somos bebês produzimos bastante lactase, mas após a fase de desmame essa produção cai, por isso algumas pessoas podem desenvolver intolerância à lactose em alguma fase da vida. Nesses casos, ao consumir leite e derivados, a pessoa pode apresentar sintomas desconfortáveis como flatulência, dores abdominais, náuseas, desconforto, gases e até diarreia. 

Por outro lado, muita gente continua produzindo essa enzima, o que chamamos de “persistência da lactase” e digere a lactose tranquilamente. Mesmo quem não consegue digerir a lactose, é bom saber que sua microbiota ama esse açúcar. Por isso, mesmo com intolerância é possível ficar bem ainda que sua alimentação tenha um pouco de lactose.

Também se fala que a lactose pode levar ao ganho de peso. No entanto, sabemos que nenhum nutriente tem o poder de, sozinho, levar ao ganho ou à perda de peso.

Também se fala por aí que os lácteos devem ser eliminados da alimentação porque são inflamatórios. Não é isso que a ciência vem mostrando. Uma revisão sistemática publicada em 2017 conclui que o leite e seus derivados, principalmente os fermentados (por exemplo, iogurte, coalhada, leite fermentado) apresentam propriedades anti-inflamatórias em pessoas saudáveis e com problemas metabólicos. 

Foto: Shutterstock

Outra revisão sistemática de 2019 avaliou os efeitos do leite e de seus derivados nos biomarcadores inflamatórios, concluindo que eles não apresentaram efeitos inflamatórios em pessoas saudáveis ou com alterações metabólicas e ainda encontrou que a maioria dos estudos indicou um efeito anti-inflamatório significativo.

Mais estudos e de melhor qualidade são necessários, mas o que sabemos até agora é que, se você não tem intolerância à lactose ou alguma alergia à proteína do leite e se você gosta de leite e derivados, não há porque excluir esse alimento da sua alimentação. 

Portanto, para a pergunta lácteos, glúten e farinha: vilões? já sabemos que os lácteos não merecem a fama. 

Glúten também não é vilão

O glúten também não é vilão coisa nenhuma. Muito se fala dele, mas você sabe o que é?

Trata-se de uma mistura de proteínas, sendo as mais conhecidas a gliadina e a glutenina. Elas são as principais proteínas presentes nos grãos de trigo. 

Proteínas semelhantes também são encontradas no centeio (secalina), na cevada (hordeína) e na aveia (avenina) e todas elas são chamadas de “glúten”.

O glúten tem uma grande importância culinária. Se você já tentou fazer pão com outras farinhas que não a de trigo branca, como farinhas de arroz ou farinha de trigo integral, deve ter percebido uma maior dificuldade para o pão crescer e adotar uma consistência agradável. 

Em contato com a água, o glúten se desenvolve e retém as bolhas de ar formadas durante a fermentação. Aprisionando esse ar, a massa pode crescer, gerando um pão areado e saboroso, com uma textura única.

Devido a essas características, o glúten pode ser usado como aditivo em alimentos processados e ultraprocessados ​​para melhorar a textura, sabor e retenção de água, como em carnes processadas, substitutos de carne vegetariana, doces, sorvetes, manteiga, temperos, recheios e molhos. 

No entanto, parece que a má fama do glúten vem de uma confusão de diagnóstico e também em alguns casos da dificuldade de ser digerido. Nós temos enzimas digestivas que ajudam o organismo a quebrar os nutrientes dos alimentos. A protease é uma delas, responsável por digerir as proteínas, porém, às vezes, não consegue quebrar o glúten por completo.

A maioria das pessoas lida com isso sem nenhum problema, enquanto cerca de 2% da população apresenta uma resposta autoimune, ou seja, o sistema imune da pessoa ataca os próprios tecidos quando entra em contato com o glúten, condição conhecida como Doença Celíaca. 

Na Doença Celíaca, os sintomas intestinais mais comuns são: diarreia, dor no estômago, inchaço abdominal, flatulência, indigestão, constipação, mas, devido ao comprometimento da absorção de nutrientes, também pode ser observado cansaço, desnutrição, perda de peso, dermatites e até danos neurológicos.

Hoje, o melhor tratamento para a Doença Celíaca é retirar o glúten da alimentação. Outras condições em que o glúten traz problemas de saúde é no caso de sensibilidade não celíaca ao glúten, na qual os sintomas são parecidos com a Doença Celíaca, mas não é observada uma reação autoimune. E na alergia ao trigo, quando as proteínas desse grão geram uma reação alérgica.

No entanto, se você não apresenta nenhum desses três problemas de saúde, não faz sentido cortar o glúten da sua alimentação. 

Farinha também não pode?

As farinhas viraram vilãs ultimamente. Quando se trata da farinha de trigo branca, há quem recomende sua exclusão da alimentação pela presença do glúten, que como já dito acima, não merece ser demonizado.

Outro motivo, e este se estende também para as farinhas refinadas de uma forma geral, é que elas são ricas em carboidratos e pobres em fibras, vitaminas e minerais, pois no processo de refinamento acaba perdendo partes dos grãos ricos nesses nutrientes.

No entanto, é bom lembrar que utilizamos as farinhas para preparar alimentos, como pães, biscoitos, massas e que geralmente são consumidos com outros, que podem muito bem ter um conteúdo de fibras, vitaminas, minerais, proteínas, gorduras.

Por exemplo, ao fazer uma torta com farinha branca, o recheio pode ser de frango com tomate, queijo com espinafre, legumes, entre outros. 

Sem falar que os carboidratos não deveriam ser demonizados. O corpo e o cérebro precisam deles para obter energia. Não há motivo para cortar carboidratos e farinha da alimentação. Ter esse comportamento, na verdade, pode contribuir para um maior desejo por esses alimentos, levando a um consumo exagerado, quando devemos ter moderação. 

Pode comer de tudo, mas não tudo!

Portanto, deixe os modismos de lado e tenha uma alimentação variada, focando em consumir mais comida fresca e caseira e cultivando uma relação de paz com a comida e com o corpo.

Juntos vamos parar o terrorismo nutricional!

Bon appétit!

 

 

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