Tratamento com vírus é esperança contra o câncer
Trabalho usa engenharia genética para modificar vírus para combater tumores
Os tratamentos para o câncer têm apresentado um grande avanço nos últimos anos. E, com o avanço da genômica, foi possível desenvolver novas e mais eficientes formas de combater os tumores, tanto os mais conhecidos como os mais raros.
Neste artigo, você vai ler:
E uma das linhas de pesquisa que vem se desenvolvendo nos últimos dez anos é a utilização de vírus modificados para contaminar os tumores e, dessa forma, estimular o próprio sistema imunológico do paciente a combater a doença.
É nesse cenário que o centro de pesquisa e tratamento contra o câncer City of Hope, nos Estados Unidos, apresentou boas notícias recentemente. Em parceria com a empresa de biotecnologia australiana Imugene, os pesquisadores do centro apresentaram o tratamento chamado de CF33-hNIS, ou simplesmente Vaxinia.
O tratamento consiste em utilizar um vírus chamado de oncolítico, que é capaz de infectar e matar a célula cancerosa. Ao morrer, as células cancerígenas liberam mais cópias do vírus, o que gera uma resposta imunológica do organismo, que passa a combater o câncer também.
No caso da Vaxinia, o vírus oncolítico utilizado é uma versão geneticamente modificada do vírus da varíola. Ele é programado para atacar apenas as células cancerígenas e não provoca a doença nos pacientes.
De acordo com a médica Carolina Chaul, coordenadora da área de Neuro Oncologia da Dasa, os poxvírus – causadores de doenças como a varíola e a varíola dos macacos – têm uma afinidade maior com o nosso organismo e, por isso, estão sendo usados nos testes para esse tipo de tratamento.
“A resposta imunológica que eles geram é maior do que com outros tipos de vírus”, afirma a especialista. Outro vírus que também vem sendo testado para o tratamento contra o câncer é o adenovírus, também modificado em laboratório para atacar as células tumorais.
Nesse sentido, um outro estudo recente também mostrou resultados bastante animadores ao utilizar um adenovírus geneticamente modificado para combater tumores chamados gliomas, considerados raros e que costumam aparecer bastante entre crianças.
No caso do tratamento Vaxinia, associou-se ao vírus oncolítico o uso do medicamento pembrolizumabe para aumentar a resposta imunológica. No caso do tratamento com adenovírus, os médicos preferiram associar o uso do vírus com sessões de radioterapia.
Mas o uso de vírus modificado é vacina?
Não. De acordo com Chaul, as vacinas contra determinados tipos de câncer de fato são uma forma de tratamento que existe, mas são diferentes dos tratamentos com vírus.
No caso das vacinas, elas são feitas a partir de algum material que tenha afinidade com o vírus: material genético (DNA ou RNA), proteínas, peptídeos ou até a célula tumoral inteira.
Elas então são injetadas no paciente, estimulando o sistema imune a combater o câncer. Para entrar no corpo, elas podem ou não utilizar um vetor viral – ou seja, um vírus geneticamente modificado que carregaria esse material do câncer dentro.
Atualmente, já existe tratamento utilizando vacina para combater alguns tipos de câncer de pele e também de próstata.
No caso dos tratamentos com vírus, eles são geneticamente modificados para atingir um ou mais dos seguintes objetivos:
- Matar a célula tumoral (capacidade oncolítica);
- Gerar uma inflamação no local do tumor, fazendo com que o corpo elimine parte do câncer sozinho;
- Ser um vetor para carregar alguma molécula capaz de infectar e matar a célula tumoral, como as de quimioterapia.
De acordo com Chaul, por enquanto ainda não existem tratamentos desse tipo disponíveis comercialmente. “Mas acredito que isso logo estará disponível, pois é o futuro do tratamento do câncer, especialmente em pacientes em que a doença resiste aos tratamentos convencionais”, afirma.
A importância da genômica
Quando falamos em tratamentos tão especializados para o câncer, é impossível não ver a relevância que o avanço na área de genética e genômica tem para o desenvolvimento de novas opções para combater a doença.
Tanto no caso das vacinas como nos tratamentos que utilizam vírus modificados, a engenharia genética permitiu entender a estrutura de funcionamento dos genes no nosso corpo e como ela influencia ou não no combate ao câncer.
Também auxiliou a entender melhor a composição genética dos tumores, facilitando a manipulação de vírus em laboratório para auxiliar no tratamento de forma mais focada em cânceres específicos.
“Identificar as mutações e oferecer o medicamento adequado é fundamental para o melhor desempenho do tratamento”, afirma Rafaela Cardoso, oncologista do Hospital Brasília.
“Com o entendimento molecular mais avançado da biologia dos tumores, o tratamento será cada vez mais personalizado e bem-sucedido”, acredita a especialista.