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Por que estamos tão cansados?

Exaustão emocional e desânimo têm se tornado frequentes entre as pessoas

Por Danielle SanchesPublicado em 25/07/2022, às 22:03 - Atualizado em 25/05/2023, às 15:23
Foto: Shutterstock

“Acordei, mas não recomendo”. “Bom dia, já acordei cansada”. “Pareço acabada e estou mesmo.” Estas são algumas frases de posts bem humorados que circulam diariamente nas redes sociais e são um sucesso entre os multiatarefados, que vivem “on” e se acostumaram com um mundo em que tudo é (ou deveria ser) muito veloz.

Esse excesso de atividades, que descamba em um tipo de estafa psicológica, se acentuou ainda mais durante a pandemia do novo coronavírus e consiste em um tipo de inércia física e mental que permeia todos os âmbitos da vida. O trabalho só é feito após baldes de café (outro meme de sucesso, diga-se de passagem); o cuidado com os filhos é desgastante; e até sair de casa para fazer coisas que dariam prazer, como encontrar os amigos, pode se tornar um peso.  

Curiosamente, nunca estivemos tão conectados como agora. Checamos e-mails o tempo todo, somos bombardeados por propaganda online e acabamos fazendo compras com apenas um clique, estamos sempre em busca de novas séries em plataformas de streaming e olhando de forma insistente as redes sociais para validação social.  

Ou seja, mesmo quando estamos em casa tentando relaxar, no fundo, o que fazemos é encher nosso suposto “tempo livre” com atividades das mais variadas que acabam mantendo a mente ocupada, ativada e estimulada.  

“É uma sobrecarga sensorial que nos deixa o tempo todo alertas e menos relaxados”, explica Rodrigo Martins Leite, coordenador da Telemedicina e Relações Institucionais e dos Ambulatórios do IPq (Instituto de Psiquiatria) do HCFMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo). “Ficamos checando o tempo todo as redes, os e-mails, o que também aumenta nosso estado de apreensão”, diz.  

O resultado, claro, é um cansaço mental enorme e que facilmente pode descambar para algum tipo de transtorno mental. Não à toa, hoje o Brasil é considerado um dos países mais ansiosos do mundo, com mais de 19 milhões de pessoas sofrendo de ansiedade crônica. Em outra frente, os casos de Burnout seguem aumentando no mundo todo, especialmente com a volta ao trabalho presencial depois de dois anos de isolamento e home office.  

Good vibes nem tão good

Pergunta: quantas vezes nos últimos dias você tirou um dia para fazer nada? Nada mesmo – sem televisão, sem podcasts, sem tarefas do dia a dia da rotina doméstica. Apenas um momento para respirar fundo, observar a cidade, as pessoas. Ou: nos últimos tempos, quantas vezes você se deixou surpreender pelas coisas e pôde contemplar algo?  

Se a resposta não vier, está tudo bem. A sociedade moderna é feita disso mesmo: uma sucessão de estímulos e tarefas que precisamos dar conta para sermos sempre vistos, queridos e admirados.  

Diferente do que era há uns 50 anos, hoje a cultura vigente prega que somos donos do próprio destino e que, se fizermos tudo direitinho, seremos recompensados por tanto esforço. 

E, dessa forma, nos tornamos os nossos próprios carrascos, aumentando cada vez mais o nível de exigência pessoal e empurrando para longe os limites do que nosso cérebro e corpo conseguem, de fato, lidar.  

Essa é a essência da tese defendida no livro “Sociedade do Cansaço”, do filósofo sul-coreano Byung-Chul Han. Para ele, “somos, ao mesmo tempo, prisioneiro e vigia, vítima e agressor.”  

Em pouco mais de 120 páginas, Han descreve como esse estilo de vida nos produz um caldo perfeito para transtornos mentais ao tirar de nós a tranquilidade. Os momentos de ócio, tão necessários, se tornam angustiantes pela falta de propósito “útil” para aquele momento.  

“É como se precisássemos estar disponíveis o tempo todo para criar algo novo, sensacional, e assim, conseguir um elogio, uma recompensa”, afirma Rodrigo Costa Oliveira, psicólogo hospitalar do Hospital Universitário Onofre Lopes (Huol/UFRN), no Rio Grande do Norte. “Só que não fomos feitos para estarmos constantemente estressados e apreensivos e é por isso que adoecemos”, diz.  

Nesse cenário, as mulheres acabam se tornando vítimas fáceis da exaustão. Isso porque, além de serem cobradas – às vezes, mais do que os homens – por resultados no ambiente de trabalho, elas ainda acumulam as tarefas domésticas e cuidados com familiares quando chegam em casa.  

A chamada carga mental é um dos principais motivos que levam as mulheres a sofrer mais de depressão e ansiedade, de acordo com diversos estudos. Some-se a isso o peso que muitas carregam de se dedicar à sobrevivência e ao cuidado de outras pessoas (filhos pequenos, pais idosos) em um trabalho invisível e não-remunerado, mostrando e temos uma boa visão do por quê elas acabam ficando tão exaustas.  

Foto: Shutterstock

Lidando com a exaustão

De acordo com Oliveira, um dos motivos que nos leva à exaustão é justamente focar nossos pensamentos e esforços no outro, no virtual, nos estímulos – em qualquer lugar, menos em nós mesmos.  

“No fundo, falta conexão com o nosso eu, com as nossas prioridades”, afirma. “É um exercício diário avaliar o que de fato queremos e precisamos e se realmente temos que atingir determinada expectativa se ela não é nossa”, afirma.  

O problema é que tudo isso demanda tempo – um tempo que, na lógica da hiperprodutividade, é perdido. Essa é a mesma lógica do por que muitos de nós vivemos evitando aquele encontro com os amigos ou relacionamentos amorosos. “Tudo isso dá trabalho, tem seu tempo para acontecer, mas queremos que seja rápido para poder passar para a próxima tarefa”, diz o psicólogo.  

O resultado disso, claro, não é bom. “O sujeito está esgotado, depressivo.(…) Totalmente incapaz de sair de si, estar lá fora, de confiar no outro, no mundo, fica se remoendo, o que acaba levando ao esvaziamento”, diz Han em seu livro.  

“Temos uma desconexão com o outro, com o coletivo, e estamos perdendo a capacidade de aceitar o diferente, a diversidade e até pessoas que têm ideias opostas às nossas porque dá trabalho lidar com isso”, explica. “Cansa só de pensar, certo?”, diz ele, bem humorado. 

Mas como sair desse atoleiro e conseguir lidar com os desafios sem, no entanto, gastar até a última gota de energia vital? De acordo com Bárbara Santos, psicóloga da Clínica Holiste, em Salvador, o primeiro passo é aceitar que as coisas na vida real, fora das telas, levam um tempo para acontecer e, por isso, precisamos treinar nossa capacidade de resiliência e aceitação.  

“Ao invés de desmarcar o compromisso em cima da hora, busque colocar menos atividades na agenda e diga ‘não’ quando não for possível ou quando você não quiserquer estar lá”, afirma Santos.  

Ou seja, o mais importante é voltar a atenção para si e de fato buscar realizar aquilo que for possível, buscando abrir espaço para momentos de ócio. “Precisamos planejar o que dá para fazer de forma confortável, só assim vamos conseguir ter a sensação de missão cumprida e não de frustração.” 

Arte: Andrea Petkevicius
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